Com apenas 18 anos, Afonso Santos, natural da Póvoa de Varzim, é já um dos nomes mais promissores do automobilismo português. A sua história foge por completo ao percurso tradicional da maioria dos pilotos e, talvez por isso mesmo, desperta atenção e curiosidade.
Sem passagem pelos karts, sem escolas clássicas de formação, Afonso construiu o seu ADN competitivo num território durante muito tempo subestimado: o simulador. Um ponto de partida improvável que, ao longo de poucos anos, se transformou em resultados reais, títulos discutidos até ao último metro e uma maturidade competitiva surpreendente para a idade.
A sua época de 2025, dividida entre a Montanha e os Ralis, foi a confirmação de que o talento que muitos viam como precoce é, afinal, sólido, sustentado e preparado para desafios cada vez maiores.
Uma paixão que começou antes de saber o que era competir
A ligação de Afonso aos carros surgiu numa idade em que a maioria das crianças ainda descobre brinquedos. O ambiente familiar foi decisivo e o papel do pai absolutamente determinante nesse primeiro contacto com o mundo automóvel: “Lembro-me perfeitamente de ter três ou quatro anos e já gostar imenso de carros, muito por causa do meu pai. Nós tínhamos um simulador em casa e, sempre que tinha algum tempo livre, era ali que eu estava. Era o meu espaço, onde passava horas e horas.”
Aquilo que para muitos poderia ser apenas uma brincadeira tornou-se, com o passar dos anos, uma verdadeira escola. Afonso não via o simulador como um jogo, mas como um ambiente onde aprendia, errava e corrigia: “No simulador conseguimos aprender muita coisa: perceber o comportamento do carro, antecipar reações, sentir limites. Aprende-se a ler a pista, a ser progressivo, a não forçar quando não é preciso. Tudo isso ficou muito natural”. Esse longo percurso virtual acabou por moldar uma base técnica invulgar, que mais tarde facilitaria uma transição que muitos imaginariam difícil.
A passagem para o mundo real: natural, intuitiva e sem medo
Depois de anos de aprendizagem no mundo virtual, o grande momento chegou aos 16 anos, pilotou, pela primeira vez, um carro de competição real. O que poderia ser um choque revelou-se surpreendentemente simples. “Achava que ia ser um impacto enorme, mas foi exatamente o contrário. Tudo foi muito natural e intuitivo. As referências estavam lá, o controlo estava lá, e senti-me confortável desde o primeiro momento.”
Essa adaptação rápida abriu a porta ao passo seguinte. Em 2024, surgiu a oportunidade de competir oficialmente no Campeonato de Portugal de Montanha, ao volante de um BRC B49. Para um jovem em ano de estreia absoluta, o desafio era enorme, mas a resposta foi à altura. Afonso mostrou consistência, ritmo e uma capacidade notável de aprendizagem, terminando o campeonato como 2º colocado entre os Protótipos B: “Foi um ano muito positivo para mim. Era tudo novo, mas consegui crescer prova após prova e terminar como vice-campeão deu-me ainda mais motivação para continuar.”
2025: lidar com dificuldades e competir em dois mundos
A entrada em 2025 foi feita com plena consciência de que o nível de exigência iria aumentar. Afonso sabia que dividir a época entre a Montanha e os Ralis implicaria um esforço físico, mental e logístico considerável: “Desde o início sabia que não ia ser uma época fácil. São dois campeonatos muito diferentes, com abordagens completamente distintas.”
No Campeonato de Portugal de Montanha JC Group, voltou a ser um dos protagonistas da Divisão Protótipos B. Num total de oito provas, venceu duas, subiu ao pódio em seis. A luta pelo título foi intensa e só terminou na última fase do campeonato, com Afonso a fechar a época no 2.º lugar, a apenas 1,5 pontos do campeão. Paralelamente. conquistou o 3.º lugar absoluto e o 1.º lugar na Taça de Portugal de Montanha – Protótipos B, e alcançou um feito histórico no Caramulo Motorfestival. Ao vencer este evento à geral, tornou-se o piloto mais jovem de sempre a conquistar essa prova emblemática.
“Tivemos alguns problemas mecânicos, inclusive uma prova sem pontuar devido à cedência do motor, e isso acabou por nos dificultar muito o caminho. O objetivo era ser campeão, mas apesar de tudo considero que o balanço é positivo. Fomos rápidos, fomos competitivos e mostramos ritmo ao longo de toda a época.”
O desafio dos ralis: aprender depressa num ambiente de elite
Em 2025, Afonso viveu também uma das experiências mais marcantes da sua jovem carreira: a integração no FPAK Junior Team de Ralis. Entre cerca de 600 candidatos, foi um dos cinco selecionados, destacando-se ainda por ser o mais novo, o único menor de idade e o único sem carta de condução no início do projeto.
Ao volante de um Peugeot 208 Racing (Rally6), participou em cinco ralis, terminando todos no pódio, com exceção do Rali de Chaves, onde um acidente ditou a desistência: “Foi um projeto muito importante para mim. Deu-me muitos quilómetros, muita experiência e obrigou-me a evoluir rapidamente. O nível era altíssimo e o ritmo muito elevado.”
O resultado foi o 3.º lugar no FPAK Junior Team de Ralis, numa classificação decidida apenas na última prova: Até ao fim estava tudo em aberto. Tivemos um pequeno toque numa especial que nos obrigou a reduzir bastante o ritmo e isso acabou por nos tirar a possibilidade de lutar pelo segundo lugar. Ainda assim, não encaro 2025 como uma derrota, mas como uma enorme aprendizagem.”
2026: ambição controlada e um passo bem pensado
Com apenas 18 anos e já recém-encartado, Afonso Santos olha agora para o futuro com ambição. O objetivo passa por dar o salto para os ralis a tempo inteiro, apostando no Campeonato de Portugal de Ralis 2RM, na Copa Peugeot Portugal e na Copa Peugeot Ibérica, ao volante de um Peugeot 208 Rally4: “Gostava muito de dar o passo para o Campeonato Nacional de Ralis. A melhor forma de o fazer seria na classe Rally4. Apesar de me adaptar bem a carros de quatro rodas motrizes, sei que esse salto implica um orçamento muito maior.”
Ainda assim, a estratégia passa por crescer de forma sustentada: “Estamos neste momento a tentar reunir o maior número de apoios possível para viabilizar este projeto. Queremos garantir retorno máximo a quem nos apoia, seja em visibilidade nacional, ibérica, redes sociais, eventos ou impacto mediático. E levar o nome da Póvoa de Varzim além-fronteiras.”
Aos 18 anos, Afonso Santos já provou que o talento não tem apenas um caminho possível. Do simulador às rampas, das rampas aos ralis, construiu um percurso consciente, sólido e sustentado, sempre com uma leitura madura do desporto e dos passos a dar: “Nada disto seria possível sem o apoio da minha família, amigos, equipa e patrocinadores.”
O presente confirma o potencial. O futuro, a manter este ritmo, promete consistência, crescimento e uma carreira construída com cabeça, talento e ambição.
